20/12/2019
A 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) manteve a condenação de uma diretora de escola que se recusou a rematricular um adolescente surdo na instituição. O aluno frequentou todo o ensino fundamental na unidade, um colégio particular de um município do sul do Estado, mas foi obrigado a mudar de escola após ter negada a rematrícula para o ensino médio. Condenada em 1º grau por praticar conduta vedada pela Lei 7.853/89, que dispõe sobre o apoio às pessoas com deficiência, a diretora apelou ao TJSC com o argumento de que agiu mediante justa causa. Também alegou insuficiência de provas da negativa de matrícula entre outras razões expostas no recurso.
Em matéria sob relatoria do desembargador Sérgio Rizelo, no entanto, foi reconhecida a ilegalidade da exclusão imposta ao adolescente. Conforme destacou Rizelo, houve negativa expressa e documentada do colégio para a participação do aluno no ano letivo que seguiria, justamente fundada na “dificuldade apresentada por ele”. Em outras palavras, reforçou o relator, claramente devido a sua surdez.
No julgamento, o desembargador Sérgio Rizelo fez uma detalhada contextualização do caso, com atenção a depoimentos e documentos juntados ao processo. Uma manifestação elaborada pela coordenação da escola, identificada como “relatório do aluno”, informava que a instituição não ofertaria matrícula ao estudante a partir de 2015, indicando que a família procurasse outra escola que atendesse a suas “reais necessidades”.
O documento, observou o relator, não tratava de mera sugestão à família, mas de decisão final sobre a não aceitação do aluno. Isso porque a diretora tinha a última palavra sobre o assunto, conforme foi esclarecido nos autos. Mesmo a alegação de que o colégio não tinha condições de contratar um professor auxiliar, por não haver educador com aquela especialidade na região, se mostrou insustentável no processo. A nova escola que o adolescente passou a frequentar, destacou o desembargador relator, tinha como educadora suplementar (de Libras e português) uma profissional originária da mesma cidade.
Para o desembargador Sérgio Rizelo, também é inaceitável a conclusão da ata de reunião pedagógica que verificou que o aluno não tinha capacidade de “inclusão” na rede de ensino regular, sugerindo que sua participação ocorria “apenas como um observador”. Conforme verificado no processo, a deficiência do aluno não é cognitiva nem psicológica, somente física (auditiva, por causa de infecção na infância). “Assim sendo, não há motivo algum para que ele não possa frequentar a rede regular de ensino, sendo estabelecido por nada menos que a Constituição Federal que as pessoas com deficiência serão educadas preferencialmente nesta, e não em rede especial, norma essa aplicável não só às escolas públicas mas também às privadas, como é o caso da instituição em foco”, escreveu Rizelo.
Se houve dificuldade na assimilação dos conteúdos, prosseguiu o desembargador, isto não se deu pela surdez do aluno, mas pela “inadmissível incompetência da própria instituição de ensino em prover ao estudante os mecanismos necessários ao seu aprendizado, em avaliá-lo de forma condizente com a sua evolução”. Considerando que o adolescente nunca teve de repetir ano, observou o relator, presume-se que seu desempenho sempre foi julgado adequado. Até que a mãe procurasse o apoio do Ministério Público para garantir uma educação completa ao seu filho, nunca houve manifestação da diretora sobre eventual incapacidade de inclusão do aluno na rede de ensino regular. Na avaliação do relator, tal fato desmascara a alegação de que o jovem, de repente, precisaria de educação em rede especial. Além disso, também foi verificado que o adolescente não teve qualquer tipo de adaptação à nova escola.
“É oportuno consignar que seria lamentável se não fosse trágica a opção da recorrente de não aperfeiçoar a escola que comandava em favor de todos os alunos e de negar adotar educação inclusiva a quem possui necessidade especial no ensino regular”, concluiu Rizelo.
Assim, o julgamento da 2ª Câmara Criminal manteve os termos da sentença condenatória, que substituiu a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, consistente em prestação pecuniária, apenas ajustando para o valor equivalente ao do salário mínimo. Também participaram do julgamento os desembargadores Volnei Celso Tomazini e Norival Acácio Engel. Caso em segredo de justiça.
Fonte: TJSC