Inconstitucional lei municipal que concedeu benefícios fiscais em decorrência da pandemia.

Em sessão semipresencial realizada nessa segunda-feira (14/6), os Desembargadores do Órgão Especial do TJRS julgaram inconstitucional lei do município de Crissiumal, que concedia desconto de 30% no valor do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), no valor da Taxa de Licença para Localização e Funcionamento e da Taxa de Vistoria e Fiscalização de Estabelecimento, além de outros benefícios fiscais.
Caso
O Prefeito de Crissiumal ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a Lei Municipal nº 4.052, de 14 de setembro de 2020, de origem do Legislativo, que criou o Programa Municipal de mitigação dos efeitos financeiros decorrentes da pandemia pelo coronavírus. Além de conceder desconto de 30% no valor do ISSQN fixo, na Taxa de Licença para Localização e Funcionamento e na Taxa de Vistoria e Fiscalização de Estabelecimento, a legislação concedeu, para todos os munícipes que se encontrassem em débito com o erário, anistia de multa e juros para os pagamentos efetuados ou parcelamentos solicitados até o dia 31 de dezembro de 2020.
Conforme o Executivo, “a calamidade pública causada pelo novo coronavírus foi utilizada como argumento para legislar de forma inconstitucional, uma vez que não é atribuição da Câmara Municipal reduzir/renunciar receita pública”. Ressaltou também que a norma cria benefícios expressamente vedados pela Lei Complementar Federal nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal), pela Lei Federal nº 9.504/97 (Lei Eleitoral) e pela Lei Complementar Federal nº 173/20 (Lei de Enfrentamento do Coronavírus). Por fim, informou que “tal tipo de programa de regularização fiscal já foi instituído pelo Município em vários exercícios anteriores, sem que houvesse situação de emergência, porém de iniciativa do Poder Executivo”. E que há leis anteriores concedendo idênticos benefícios.
Decisão
O relator do processo no Órgão Especial foi o Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos. Segundo ele, são beneficiados pela lei os profissionais autônomos, estabelecimentos comerciais e industriais do município. No entanto, conforme o magistrado, não há estudo de impacto financeiro-orçamentário da norma, necessário para a elaboração de leis que concedem benefícios fiscais.
O projeto de lei, de autoria do legislativo, recebeu veto do Prefeito, que foi derrubado pela Câmara Municipal.
O Desembargador Brasil Santos afirmou que em matéria tributária, “a competência legislativa é concorrente, conforme entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal, de modo que ausente vício formal de iniciativa na proposição legislativa”. Porém, afirma o relator, “esta Corte, em casos semelhantes, vem decidindo pela inconstitucionalidade de leis concessivas de benefício fiscal aprovadas sem qualquer estudo de impacto orçamentário-financeiro, exigência inserida no artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal ”.
“Apesar de a norma aqui questionada conceder benefícios fiscais, implicando renúncia de receita, não foi acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro, tampouco estabeleceu qualquer fonte de compensação, a fim de preservar o equilíbrio financeiro do ente municipal. Tal situação, além de violar disposição do artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), revela desrespeito ao princípio da razoabilidade, insculpido no artigo 19 da Constituição Estadual”, afirmou o relator.
No voto, o relator destaca que “a previsão de forma indiscriminada de benefícios fiscais pode ter grande impacto na prestação de serviços públicos pelo ente municipal, especialmente na área da saúde, ainda mais relevante neste momento de crise”.
“Embora a Emenda Constitucional nº 106/2020 tenha o objetivo de facilitar a execução orçamentária de medidas emergenciais, considerando a situação de calamidade pública causada pelo novo coronavírus, a previsão específica do seu artigo 3º, uma vez que dispensa a observância apenas das limitações legais, não se mostra suficiente para afastar a aplicabilidade do artigo 113 do ADCT, norma constitucional que deve permanecer sendo observada nesse período de pandemia”, decidiu o magistrado.
O voto foi acompanhado pela unanimidade dos Desembargadores do Órgão Especial.
Processo 70084654243

Fonte: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul