28/04/2020
A concessão pelo Judiciário de maior prazo para pessoas jurídicas pagarem tributos durante a pandemia da Covid-19 só deve ocorrer se ficar comprovado o abalo financeiro sofrido, “com risco concreto à subsistência da empresa, à manutenção de empregos e à própria continuidade da prestação do serviço e/ou fornecimento de bens”. Além disso, deverá se tratar de empresa que não esteja demitindo funcionários e tenha um histórico de boa pagadora de obrigações com o fisco.
Esse tem sido o entendimento do desembargador federal Marcus Abraham, que integra a Terceira Turma Especializada, uma das duas do TRF2 que julgam processos tributários. Com base nessa fundamentação, o magistrado já negou recursos apresentados na Corte por pessoas jurídicas que tentam obter liminar para suspensão ou postergação do pagamento de dívidas fazendárias.
Casa e Vídeo
Um dos casos mais recentes foi o da rede de loja de departamentos Casa e Vídeo, que tem unidades em todo o estado fluminense, no Espírito Santo e em São Paulo. A empresa ajuizara ação na primeira instância requerendo a prorrogação das cobranças de diversos tributos federais, inclusive as referentes a parcelamentos fiscais. O juízo de primeiro grau negou a liminar e, por conta disso, o grupo apresentou agravo no TRF2.
Dentre outros argumentos, a Casa e Vídeo sustentou que a pandemia a impedira de exercer suas atividades, ficando impossibilitada de gerar caixa para honrar compromissos com a Receita. A empresa invocou a Portaria nº 12, de 20 de janeiro de 2012, do Ministério da Fazenda, que garantiria o adiamento dos vencimentos de tributos em razão de declaração de estado de calamidade pública. O mérito do agravo ainda deverá ser julgado pelo TRF2.
Em sua decisão, Marcus Abraham reconheceu que estabelecimentos que não prestam serviços essenciais estão com funcionamento suspenso, o que pode impactar no atendimento de obrigações trabalhistas e com fornecedores, mas observou que “empresas de maior porte como a agravante, ainda continuam possibilitadas de oferecer seus produtos e serviços através do comércio on-line, não sendo possível inferir a completa descontinuidade de suas atividades, conforme alegado”.
Decisões do TRF2
Após citar outras decisões de outros magistrados, da Terceira e da Quarta Turmas do TRF2, que também rejeitaram a aplicação da Portaria 12/2012 em razão da pandemia, o desembargador explicou que a norma administrativa foi editada para atender situações enfrentadas por municípios atingidos por enchentes e deslizamentos naquele ano, “cenário completamente diferente do atual”, concluiu.
O relator ainda lembrou que a utilização da portaria depende de regulamentação por parte da Receita Federal e da Procuradoria da Fazenda: “Por outro lado, a sua aplicação por analogia pelo Poder Judiciário imprescinde de muita cautela, sob pena de comprometer a atuação estratégica do Governo Federal na presente crise”, destacou.
Marcus Abraham finalizou sua decisão ressaltando que a atuação judicial nesse caso não pode se dar de forma genérica, devendo ocorrer de forma excepcional, após a análise de cada caso concreto, considerando os efeitos na arrecadação e a conveniência de o Estado suportar um atraso no recebimento de tributos para garantir a subsisitência da empresa “para que ela possa manter empregos, continuar a funcionar e prestar bens e serviços à sociedade, ou seja, cumprir sua função social”.
Proc. 5003596-11.2020.4.02.0000
Fonte: TRF2