19/05/2020
Para juíza, político praticou improbidade administrativa em mutirão oftalmológico
O vereador da cidade de Santa Luzia, Sandro Lúcio de Souza Coelho, foi condenado, em primeira instância, pela juíza Sabrina Alvez Freesz, da 1ª Vara Cível daquela comarca, a pagar uma multa correspondente a 10 vezes o valor de seu salário, por atos de improbidade administrativa,cometidos na utilização de uma escola pública para relização de exames de vista gratuitos para a população.
A condenação, publicada na vigência do plantão extraordinario, no último dia 14/05, acatou parcialmente o pedido do Ministério Público de Santa Luzia, que pediu também a condenação do diretor da escola pública.
De acordo com a ação civil pública de improbidade administrativa, iniciada em 2016 pelos representantes do Ministério Público, o vereador divulgou, em 2014, por meio de suas redes sociais e na imprensa, a realização do “Mutirão Oftalmológico”, para exames gratuitos de vista, na Escola Estadual Leonina Mouthé de Araújo.
O diretor da escola, na época, também foi denunciado por danos ao patrimônio público, porque cedeu o imóvel e dois servidores para apoio às atividades, que ocorreram em um sábado. O juiz, porém, entendeu que não houve prova de irregularidades em tais atos.
Denúncia
A ação foi baseada em inquérito civil público, instaurado a partir de uma denúncia anônima, em representação encaminhada à Ouvidoria do MP local em 20/05/2014. De acordo com a denúncia, o vereador Sandro Coelho havia “transformado em palco político” a Escola Estadual Leonina Mouthé de Araújo, por meio da promoção de exames de vista gratuitos, realizados no dia 5/04, o que se repetiria no dia 24/05 daquele ano.
A Polícia Militar foi acionada pelo MP e registrou o Boletim de Ocorrência que embasou o inquérito civil público. O inquérito apontou que, durante a diligência realizada pela PMMG durante o segundo evento, o vereador Sandro Coelho confessou que fazia o trabalho em nome próprio e que, após divulgação na rede social Facebook, ele mesmo cadastrava os interessados em seu gabinete.
Também foi apurado que o então diretor da escola e colega de trabalho do vereador colocou dois servidores da escola para auxiliar no mutirão, com promessa de concessão de folga posterior.
Defesas
O diretor da escola contestou a ação e alegou que agiu dentro da legalidade, com moralidade e transparência. Ele afirmou que a Associação de Moradores do Bairro São Benedito e a Ordem dos Advogados do Brasil – Subseção de Santa Luzia, teriam formalmente solicitado a cessão do imóvel da escola citada para a realização de um “mutirão oftalmológico” nas duas datas.
Disse também que a escola já estaria aberta em razão do Programa Escola Viva e que o servidor destacado para abrir a sala onde seriam recebidos os equipamentos para os exames também já estaria no local em razão do programa.
Já o vereador alegou que o evento foi promovido pela OAB local e a Associação Comunitária do Bairro São Benedito e se opôs à ação fundada em uma denúncia anônima.
O político negou que ocorreu qualquer agendamento de consultas no seu gabinete ou qualquer outro tipo de cadastramento, salientando que as pessoas foram atendidas de forma aleatória e por ordem de chegada.
Decisão
A analisar o processo, a juíza Sabrina Alvez Freesz salientou ser “primordial que o agente público haja perante a administração pública com moralidade – atuação dentro dos preceitos éticos e moral de valores, nos termos do artigo 37 da Constituição de 1988 – e com probidade, proporcionando uma boa administração pública, nos termos do artigo 4º da Lei nº 8.429/92”.
Destacou ainda o conceito de improbidade como sendo o desrespeito, por parte do agente público, ao dever a ele imposto de agir com honestidade no exercício do cargo público que ocupa, sem que se aproveite indevidamente dos poderes e facilidades que deste decorrem, quer seja para exclusivo proveito pessoal, quer seja para benefício de outros.
Ainda observou que o efetivo dano ao erário não é elementar à configuração de ato de improbidade, sendo exigida a comprovação apenas de dolo genérico.
A juíza Sabrina Alvez Freesz destacou inúmeras inconsistências nas declarações do vereador. Ele negou sua participação na promoção do evento porém, em seu depoimento afirmou que foi procurado pela OAB Subseção Santa Luzia para que houvesse a divulgação da parceria realizada entre a ordem e o Instituto Hilton Rocha.
A juíza citou ainda reportagem do jornal local intitulada “Mutirão de Olhos – Parceria entre vereador Sandro Coelho e Instituto Hilton Rocha realiza 150 atendimentos oftalmológicos gratuitos”, com declarações do vereador e a informação de que o agendamento da consulta poderia ser feita por meio dos telefones divulgados como sendo os do gabinete do vereador.
A magistrada destacou ainda que, o fato do requerimento para a cessão do espaço da Escola Estadual ter sido feito pela OAB Subseção Santa Luzia e pela Associação de Moradores do Bairro São Benedito não comprova, por si só, que o evento não foi utilizado para a promoção pessoal do vereador.
A magistrada citou o Boletim de Ocorrência, no qual o político informou que vinha realizando este trabalho ao longo do ano de 2014, com o intuito de atender pessoas carentes que, após divulgação no Facebook, eram cadastradas previamente em seu gabinete, registros confirmados pelos dois policiais militares em depoimento judicial.
Improbidade
Assim, a juíza Sabrina Alvez Freesz considerou comprovada a prática de ato de improbidade administrativa por Sandro Coelho. Mas ela afastou a pretensão do Ministério Público da penalidade de ressarcimento do dano, por não ser possível averiguar a extensão do prejuízo causado ao erário pela utilização da escola estadual para fins político-partidários.
Também considerou que as sanções de perda da função pública e suspensão dos direitos políticos são extremamente gravosas e extrapolam o necessário e razoável para punir o vereador pela conduta em análise. Por fim, a juíza considerou que a multa civil é a penalidade mais adequada ao caso, sendo suficiente para punir o vereador e inibir futuras práticas semelhantes.
A juíza destacou que a Lei Estadual 11.942/95 prevê que “as entidades sem fins lucrativos legalmente constituídas poderão utilizar o espaço físico das unidades de ensino estaduais e os equipamentos nele contidos”, porém é vedada, dentre outras hipóteses, a utilização com caráter político-partidário.
A juíza Sabrina Alvez Freesz entendeu ainda não existirem provas concretas que indicassem que o diretor soubesse do caráter do evento e do envolvimento do vereador, uma vez que foi apurado que a utilização do espaço foi requerida pela OAB local e a Associação de Moradores do Bairro São Benedito.
Além disso, o relatório elaborado pela Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais, não apontou quaisquer irregularidades quanto ao processo de cessão do espaço, que observou a legislação vigente.
O processo tramitou eletronicamente sob o número 5006393-98.2016.8.13.0245
Fonte: TJGO